No ponto de ônibus

O homem caminha sozinho pela praça em direção ao ponto de ônibus.

Vestia-se como outra pessoa qualquer: camiseta cinza, boné, jeans azul e tênis preto.

No ponto já se encontravam uma jovem com calça de ginástica apertada e um colete bege sobre uma camiseta branca com a logo de uma loja qualquer; uma senhora com longos cabelos prateados e um longo vestido azul marinho acompanhada por uma garotinha de, no máximo, cinco anos de idade.

A rua estava quase deserta - vez ou outra passava um carro ou uma moto - e um silêncio pairava sobre os quatro.

O homem senta-se próximo a senhora e começa a mexer em seu smartphone.

Alguns minutos depois chega uma mulher ao ponto: alta, de longos cabelos loiros e olhar sensual vestindo um terninho preto e uma minissaia, cortando o silêncio com as batidas de seu salto alto no chão.

- Já passou o 080? - Pergunta ela.

- Ainda não. - Responde a senhora.

Passam-se mais alguns minutos e o 082 aparece, onde embarcam a jovem com a calça de ginástica apertada, a senhora e a garotinha.

- O 051 está atrasado! - Diz o homem de camiseta cinza, mais para si do que para a mulher de olhar sensual.

- Pois não? - Pergunta ela.

- Não, nada...

O homem guarda seu smartphone no bolso e começa, com o canto do olho, a observar a mulher de olhar sensual: seu corpo em forma junto ao seu quadril arrebitado por causa do salto começam a excitá-lo.

Imagens luxuriantes deles, ali mesmo, satisfazendo um ao outro tomam sua mente; gritos impróprios e imaginários tapam seus ouvidos e o fazem ficar ainda mais empolgado com a ideia de tê-la para si.

Apesar de estar em pé, quase de costas para o homem, a mulher de olhar sensual percebe seus olhares e o medo corta-lhe a espinha.

Os dois estavam sozinhos e eles sabiam disso. Ambos tinham ciência de que, mesmo que ela gritasse, ninguém ouviria.

O desejo, a excitação... E uma voz, no fundo de seu inconsciente o atiçava a atacá-la.

Foi então que uma lembrança de garoto veio à cabeça do homem: ele estava em uma sala com várias cadeiras e várias coroas de flores. Fazia frio, muito frio e ele estava sentado em frente a um caixão, onde o corpo de sua mãe estava sendo velado.

Como borrões, pessoas passavam por ele e pelo seu pai, que acariciava a cabeça da mulher morta enquanto balbuciava ameaças: "ele vai pagar! Eu prometo! Ele vai pagar bem caro por tê-la estuprado e por tê-la matado, eu prometo querida!"

Com um baque o homem se vê novamente no ponto de ônibus olhando diretamente para a mulher de olhar sensual - que, por sua vez, tentava não encará-lo. Ele se levanta e vai em direção a ela.

- Pois não...? - Pergunta ela, timidamente.

- Ah! Nada. Cansei de ficar sentado. - Responde ele.

O desejo havia passado assim como a voz em sua cabeça tinha parado de atormentá-lo. Sem saber o porquê, aquela estranha mulher de olhar sensual o fez se lembrar do pior dia de sua vida: o dia em que seu pai lhe dissera que sua mãe havia sido morta e estuprada.

Finalmente chega o 080 e a mulher de olhar sensual embarca, deixando o homem de camiseta cinza sozinho no ponto.

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