A história de um rapaz

São cinco horas da manhã e o rapaz já está de pé - porque às sete ele tem que sair para pegar o ônibus. Acordado, vai ao banheiro lavar o rosto, escovar os dentes e tomar seu banho. O pão seco, comprado na tarde do dia anterior, já está o esperando junto ao café preto.

Enquanto isso, sua esposa está tentando arrumar sua filinha, que fecha a cara para a ideia de ter ir à escola. Quando ambas estão finalmente prontas, o rapaz já terminou seu café da amanhã.

O trabalho do rapaz lhe rende, todo dia cinco, 650 reais - dinheiro contado e direcionado para pagar água, luz e colocar créditos no único celular da família. A mulher faz uns bicos de manicure e pedicure, o que ajuda a pagar as prestações da nova televisão - pequena, mas já com conversor para a TV Digital.

A única filha do casal tem nove anos e estuda em uma escola municipal a uma quadra de sua casa. Seu uniforme e seu material são doados pela prefeitura - o que incentiva o rapaz, em toda eleição, a votar no atual prefeito, crente de que fazendo isto, estará a garantir o futuro de sua primogênita.

A casa da família era pequena, erguida com muito suor, em um terreno comprado de um senhor gente fina, que concordara em fechar negócio com prestações a perder de vista. Ficava a meia hora do ponto de ônibus, que só passava de hora em hora.

O emprego do rapaz ficava quase do outro lado da cidade. Seu patrão era seu melhor amigo, pois nem o uniforme tinha cobrado dele e ainda havia lhe feito um precinho camarada para que ele pudesse fazer o mini-curso exigido pela firma.

Apesar da vida modesta, o rapaz podia sempre desfrutar de alguns prazeres, como sua cervejinha aos domingos, em frente à TV nova, curtindo seu time do coração jogar. Com sua mulher não era diferente: a melhor coisa para ela era poder assistir suas novelas e sonhar com a vida de madame - pois sempre apostava alguns trocados na loteria.

A filha do casal também aproveitava: quando conseguia convencer seus pais, pelo cansaço, a não ir para a escola, assistia todo tipo de desenho animado; em caso negativo, ainda podia desfrutar dos filmes da tarde. Nos finais de semana gostava de brincar com suas bonecas.

Durante o natal o rapaz sempre procurava ajudar um irmão menos favorecido, dando alguns trocados a pessoas que ligavam para seu celular, dizendo pedir doações em nome de entidades filantrópicas. No ano novo reunia a família em frente a televisão para assistir ao artistas tomando champanha e cantando, pedindo mais um bom ano de fartura e felicidade.

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