Um natal diferente

Lembro-me muito bem daquele dia. Cláudio, meu colega, e eu, assistíamos à Sessão da Tarde em nosso escritório quando o filme é interrompido pelo Plantão: “Interrompemos a nossa programação para informar uma grave notícia: Papai Noel está desaparecido!”

O homem que havia surgido na tela tinha curtos cabelos grisalhos, usava óculos e vestia um terno marrom por cima de uma camiseta branca e uma gravata cinza.

 “Testemunhas confirmam que sua última aparição ocorrera próxima à sua mansão, no Polo Norte, ontem, dia 23. Autoridades internacionais já estão a se mobilizar e o FBI oferece cinco mil dólares de recompensa por qualquer informação que possa levar ao bom velinho”.

— E ai, Gabriel, o que você acha que pode ter acontecido? — Pergunta Cláudio, pegando-me desprevenido.

— Confesso que não faço ideia! Quem sequestraria São Nicolau? — Respondo eu, chamando Papai Noel por seu nome menos conhecido.

— A recompensa deve ser boa: se os federais americanos estão pagando cinco mil apenas por informações, imagine pelo Noel em si. — Torna a falar Cláudio.

Não que meu parceiro e eu fôssemos caça-recompensas nem nada, mas nosso pequeno escritório de detetives precisava urgentemente de um grande caso — ou então não teríamos nem como pagar a conta de luz.

— Tentar não custa. — Respondo.

Após decidirmos que entraríamos na busca pelo velho Nicolau, nos deparamos com um impasse: por onde começaríamos? Foi então que meu parceiro teve uma ideia: “Se Papai Noel sumiu, a comunidade mágica deve estar inquieta. Acho que deveríamos começar pela ‘Toca do Lobo’ no Horto Florestal”.

A “Toca do Lobo” nada mais era que um bar de criaturas mágicas que migraram para o Brasil.

“Parece que você acertou na lata” comentei com Cláudio, ao cruzarmos a porta da “Toca”.

O estabelecimento estava quase vazio, apesar do horário. O dono e barman, um duende com cara carrancuda e um grande nariz pontudo estava no balcão, secando um caneco; em uma mesa, quase ao nosso lado, um trasgo roncava e babava em sua mesa e mais à frente, três fadinhas passavam pano em um piano.

— Em que posso ajudá-los? — Pergunta o duende, ao nos ver.

— Viemos ver como andavam as coisas no mundo mágico com o sumiço do Papai Noel. — Responde Cláudio.

— Então, se já viram...

— E também tomar um gole da melhor cerveja da região. — Interrompo, já prevendo que se caso não consumíssemos alguma coisa o duende nos colocaria para fora.

— Pois então, sentem-se, cavalheiros.

Ao nos sentarmos o duende enche dois canecos e nos entrega.

— Vocês diziam que vieram ver como andam as coisas por aqui. — Torna a falar o duende.

— Sim! Acabamos de ver no noticiário que Papai Noel sumiu. — Responde Cláudio.

— Bem, como perceberam estão todos com medo. Ontem mesmo falei com uns parentes que trabalham na fábrica do Noel e, a única coisa que conseguiram encontrar foram as renas e o trenó.

— E os presentes? — Desta vez sou eu quem pergunta.

— Levaram também.

Nessa hora as fadinhas terminam de passar o pano no piano. Uma delas, a que usava um vestidinho roxo e tinha curtos cabelos lisos e olhos da mesma cor, vem em nossa direção enquanto as outras passam por uma porta por trás do balcão.

— Vocês estão à procura do Nicolau? — Indaga-nos a fadinha.

— Sim! — Responde Cláudio. A fadinha lança um olhar para seu patrão e este responde apenas com um balançado de cabeça.

— Ano passado eu fui visitar minha irmã caçula no Polo Norte. Ela é uma fada do gelo, sabe. — Começa a fadinha. — A gente sobrevoava a mansão do Papai Noel quando o vimos em seu escritório, aparentemente muito nervoso.

— Isso ano passado? — Pergunto eu.

— Sim, mais ou menos nesta mesma época.

— E então? — Pergunta Cláudio.

— Ele segurava uma carta nas mãos. Acho que era por causa dela que ele estava tão irritado.

— Oras! Vá logo ao que interessa! — Interrompe o duende, deixando a fadinha acanhada.

— Então... Um dos duendes entra no escritório e os dois começam a discutir. Falavam sobre um Andrin, da Suíça.

— Vocês conseguiram ouvir mais alguma coisa? — Torno a perguntar.

— Bem, pelo o que me lembro, esse Andrin havia sido um menino extremamente levado. Parece que ele tinha raspado a cabeça da irmãzinha com a máquina de cortar cabelo do pai; tinha cortado todos os bigodes do gato da mãe...

— Travessuras normais para um garoto. — Comenta Cláudio, como que, indiretamente, questionando no que a informação nos poderia ser útil.

— Sim! Mas pelo o que minha prima conseguiu ouvir, o moleque havia se juntado com um tal de Rassuvetra.

Rassuvetra... Aquele nome não me era estranho, contudo, quando mais eu me esforçava para lembrar quem, ou o que, ele era, mais eu me esquecia dele.

— E então? — Pergunta Cláudio.

— Já basta! Corcra, já para a cozinha! — Interrompe novamente o duende. — Gabriel e Cláudio, infelizmente terei que pedir para que se retirem.

Sem alternativas, tivemos que nos retirar. Apesar disso, já tínhamos um nome.

— Você se lembra de algum Rassuvetra? — Pergunto ao Cláudio, já no carro, enquanto voltávamos ao nosso escritório.

— Mais ou menos. É estranho: quanto mais eu tento me lembrar, mais me esqueço dele. — Responde Cláudio.

— A mesma coisa acontece comigo.

— Espere! — Digo eu, um pouco antes de viramos na rua onde ficava nosso escritório. — Continue reto.

— Aonde vamos?

— Ver um Saci!

Mais ou menos por umas duas ou três horas seguimos pela estrada até chegarmos a um sítio, praticamente no meio do nada.

Chamo de sítio por causa da grande placa que existia em cima da porteira: Sítio Amarelo, contudo, o lugar estava mais para uma grande fazenda, devido à extensão das terras e também da criação de diversos animais.

Seguimos por uma estradinha de terra até chegarmos a uma grande mansão, onde um senhor de cabelos brancos parecia dormir em uma cadeira de balanço.

— Seu Joaquim! — Chamo eu. O senhor acorda assustado.

— Gabriel! Ara! Quanto tempo! — Cumprimenta-me o homem, dando-me um forte abraço.

— Seu Joaquim, este é Cláudio, meu sócio.

— Ara! Prazer! Joaquim! — Cumprimenta novamente o senhor, abraçando Cláudio. — Por favo! Vamo senta. Rosário!

— Por favor, seu Joaquim, não incomode a Rosário. Viemos ver o Zaki.

— Ara! E não é que o danado disse ontem mesmo que logo ia ter visita! Espere ai! — Diz-nos seu Joaquim.

Enquanto nos acomodávamos nas cadeiras de fio que existiam na varanda, o senhor anda até o meio do terreiro em frente e dá um longo assovio. Não demora muito e uma forte ventania nos cobre de poeira. De um pequeno redemoinho de terra surge uma criança negra, de cabelos raspados, gorro vermelho na cabeça e fumando um cachimbo.

— Chamo, sinhô? — Pergunta a criança.

— Tem visita pr’ocê. — Responde Joaquim.

Os dois voltam para a varanda.

— Quanto tempo, Zaki! — Cumprimento a criança, que me dá um forte aperto de mão. — Este é meu sócio Cláudio. Cláudio, este é Zaki, o saci!

Após os cumprimentos, todos nos sentamos em roda.

— Então, sinhozinho, o que ocê anda fazendo di bom? — Pergunta-me Zaki. — Veio prosear com nós?

— Sim e não. — Respondo. — Queria saber se você sabe alguma coisa ou sobre o sumiço do Papai Noel ou sobre Rassuvetra.

— Hum... Unce faz pergunta difícil. Sobre esse tar de Papai Noel eu num sei muita coisa; só sei que aqueles espíritos estrangeiros tavam falando muito a respeito dele ontem.

— E o que eles falavam? — Pergunta Cláudio.

— Ah! Diziam que tinham sequestrado ele ou coisa do tipo. Como tava curioso, perguntei pra Wald, uma espírito amiga minha, e ela mi disse que tava tudo mundo assustado e com medo.

— Você perguntou por quê? — Torno a perguntar.

— Ah! Claro, né! E ela mi disse que si não encontrassem ele até a lua surgir no céu não ia ter mais natar.

Cláudio e eu nos olhamos: parece que não haveria mais natal naquele ano.

— E sobre Rassuveta? O que você sabe sobre ele? — Torna a perguntar Cláudio.

— Ara! Ele é meu irmão! Só que ele mora lá nas Europa. Ele já veio ver a gente, mas acho que ocê num vai lembra dele porque ele não gosta que lembrem dele. Mas, eu se fosse unces não procurava por ele não.

— Por quê? — Perguntamos Cláudio e eu, em uníssono.

— Ele é do mar! Gosta de mexer com coisa que num presta.

Após Zaki nos contar tudo o que queríamos saber, nos despedimos e, após mais duas ou três horas depois, retornamos ao escritório. O relógio na parede em frente a minha mesa já marcava 12hs30min.

— Feliz natal! — Deseja-me Cláudio.

— Que natal? — Respondo eu.

No dia seguinte, 25 de dezembro, parecia que alguém muito importante havia morrido. Todos estavam de cabeça baixa e os enfeites tinham perdido o brilho.

— Bom dia! — Cumprimento Cláudio, ao chegar ao escritório.

— Bom dia! — Responde ele. — Novidades?

— Não, caso você não viu como está o clima lá fora.

— Então não...

Na televisão quase todos os canais exibiam seus jornais matinais. Em um deles, três apresentadores, uma mulher de curtos cabelos vermelhos e olhos verdes, vestindo um terninho cor de pele, um homem na faixa dos trinta e cinco anos de idade, curtos cabelos pretos e vestindo um terno preto e outro homem, que aparentava ter cinquenta anos, um topete cinza e vestindo um terno ocre, conversavam.

— ...E o que as autoridades brasileiras estão fazendo? Nada! O FBI já arrecadou diversas informações enquanto a Polícia Federal mal saiu do ponto de partida! — Exclamava o homem com o topete.

— Críticos! — Comenta Cláudio.

— Não vai ter jeito! Acho que teremos que ir ao Polo Norte. — Digo eu.

— E como faremos isso? Mal temos dinheiro para colocar gasolina e, aliás, ter procurado pelo teu amigo Zaki quase esgotou nosso tanque.

Eu não queria admitir, mas Cláudio tinha razão: como iríamos para o Polo Norte? Concordo que uma passagem de avião de onde estávamos até o Rio de Janeiro custava bem mais caro que ir para Orlando, nos Estados Unidos, mas Polo Norte...? Então, lembrei-me de uma coisa, aliás, de alguém.

— Você não tinha um irmão na Força Aérea? — Pergunto para Cláudio, pegando-o de surpresa.

— Nossa! Faz tempo que não falo com ele. — Responde-me ele. — Mas, por quê? Não estaria pensando em pedir para ele dar um “jeitinho”, ou estaria? — Eu não precisei responder, já que a resposta estava estampada em meu rosto. — Eu posso tentar falar com ele, mas não garanto nada.

Felizmente não demorou muito e, quando dei por mim, estava dentro de um avião cargueiro rumando para o Polo Norte — mais especificamente para a base de pesquisa que o Brasil possui lá.

Não tenho muito que descrever da minha chegada, a não ser que seja muito difícil imaginar uma paisagem repleta de branco, cinza e, claro, muito frio. Agora, a base de pesquisas...

O prédio, ou melhor, o contêiner, era dividido em várias secções e ao lado ficavam os alojamentos dos militares e dos cientistas — quatorze pessoas no total: 8 pesquisadores e 6 militares. Além de trabalhar, não havia muito que fazer nos dias de folga, a não ser ficar de papo furado no Facebook ou então no Skype.

— E então, o que vieram fazer aqui? — Pergunta Julia, uma morena de olhos negros e cabelos encaracolados, responsável geral da missão de pesquisa, no primeiro almoço que participamos com todos.

— Viemos investigar o sumiço do Papai Noel. — Respondo eu.

— Ah! O sumiço do Noel! O povo do vilarejo que tem aqui perto estava comentando muito a respeito disso. — Respondeu Carlos, um militar baixinho de curtos cabelos negros e olhos castanhos.

— E quais eram esses comentários? — Indaga Cláudio, entrando na conversa.

— Ah! Para começar viram um sujeito muito estranho rondar tanto o vilarejo quanto a fábrica do velho Nicolau por vários dias. — Responde Carlos, colocando uma grande colher com feijão na boca.

— Hein! Eu vou sair para colher amostras amanhã cedo; se quiserem, posso lhes dar uma carona até a mansão do Noel. — Oferece Julieta, uma mulher loira e encorpada, com cabelos dourados que iam até seus ombros.

O restante daquele dia foi realmente chato. Cláudio e eu jogamos canastra, pôquer e até mesmo rouba montes até não aguentarmos mais. Graças a Deus consegui cair no sono e acordar somente no dia seguinte.

Como eu já tinha dito, o cenário onde estava a base de pesquisa era basicamente um mar branco e cinza com um clima frio, muito frio “mesmo”! Ir para fora foi um dos maiores desafios de minha carreira — isso porque eu ainda não tinha tentado andar com a pilha de casacos que eu vestia. E para completar meu azar, a mansão do Papai Noel ficava exatamente uma hora da base.

Porém, como dizia Pessoa: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena” e valeu muito a pena o sacrifício, pois a mansão do bom velinho foi uma das coisas mais bonitas que meus olhos já haviam tido a oportunidade de vislumbrar. Não sei se conseguirei detalhar a visão que eu tive, mas tentar não custa: era um enorme casarão todo decorado com guarda-chuvinhas azul e branco; na frente existia uma enorme árvore toda enfeitada com uma grande estrela de cinco pontas no topo; uma estrela que, sem exagero algum, brilhava quase tanto o sol; as janelas pareciam ter sido feitas de açúcar e as portas de chocolate. Nas arestas tinham luzinhas amarelas que davam uma impressão ainda mais “divina” a casa.

— Vamos entrar? — Indaga Cláudio, ao sair do transe que a visão da casa havia nos provocado.

Se por fora a casa era bonita, por dentro, então... Só para dar uma ideia, a sala de estar era toda mobiliada com móveis e objetos que davam uma grande sensação de aconchego ao cômodo, fora a lareira, que, se aquela sala fosse um conto, com certeza ela seria o clímax da história.

— Pois não? — Recebe-nos um duendezinho magricela, de pijamas.

— Somos investigadores brasileiros e... — Antes de eu conseguir terminar, o duende fecha a porta em nossa cara. Torno a bater.

— Olha, moço! Desculpas pela porta, mas eu realmente estou muito cansado. Vocês são a septuagésima nona dupla de investigadores que vêm à casa do Papai Noel para investigar o sumiço dele.

— Podemos, ao menos, dar uma olhada pela propriedade? — Torno a perguntar. O duende acena com a cabeça e fecha novamente a porta.

Atrás da mansão ficava a famosa fábrica do Papai Noel — que só não era mais esplêndida que sua mansão: três albergues geminados pintados em vermelho com uma grande chaminé no meio das três e rodeado por luzinhas e sininhos.

Ao contrário do que muita gente pensa, a fábrica não produzia somente presentes materiais, mas sonhos também — qualquer tipo de sonho bom era possível ser produzido ali, conforme um cartaz anunciava logo na entrada de um dos albergues.

“Isto aqui deve ser muito movimentando durante o ano” comenta Cláudio, olhando ao redor.

Infelizmente não era possível ver nada por dentro da fábrica e as grandes portas estavam trancadas. “Gabriel, não sei se você conseguiu ver, mas a chaminé está aberta; com certeza deve existir um cano ou uma passagem que leva a fumaça produzida nos albergues para ela”, diz Cláudio.

Dito e feito: ao entrarmos pela pequena porta da chaminé nos deparamos com três passagens grandes o suficiente para Cláudio e eu engatinharmos nele.

— Então... Vamos por onde? — Indaga Cláudio, em frente à trifurcação.

— Por aqui. — Digo eu, pegando o caminho do meio.

Confesso que não havia um porque especial para utilizar o caminho do meio. Apenas segui meu instinto.

O caminho nos levou até um fogão cheio de fuligem e com uma porta emperrada.

Por causa da escuridão me lembro de ter visto pouca coisa: algumas máquinas muito estranhas assim como ferramentas que eu, nem em sonhos, imaginaria que existissem.

— Acho que somos os primeiros detetives a entrar. — Comenta Cláudio, iluminando as coisas com a lanterna do celular.

Não lembro exatamente o quanto ficamos revirando aquele albergue, mas creio que não foi por muito tempo.

— Gabriel! — Chama-me Cláudio com alguma coisa na mão. — É um bilhete.

Caro Noel!

Não sei se o senhor já ouviu falar, mas em muitos países existem leis contra o trabalho escravo.
Pense um pouco a respeito.

Um bom amigo.

Como uma luz ao fim do túnel uma ideia começou a nascer em minha mente. “Rápido, Cláudio, eu acho que sei onde está São Nicolau”.

Correndo o máximo que nossos casacos permitiam, retornamos à mansão do velho Noel. Ao bater na porta, o mesmo duende nos atende.

— Vocês de... — Antes de ele terminar de falar, dou-lhe um empurrão e entro na casa. — Mas o quê?! SEGURANÇA! — Grita o duende.

— Isso! Chame a segurança! Eles irão gostar e muito do que eu tenho a dizer. — Ameaço, olhando firme em seus olhos. Três soldados quebra-nozes aparecem.

— Eles invadiram! — Diz o duende.

— Tenho os meus motivos. — Defendo-me. — Foi ele quem sequestrou Papai Noel!

— Bobagens! Rápido, levem-no daqui! — Torna a falar o duende.

— Espere... Então, rapaz, conte-nos o que você sabe. — Pede-me um dos quebra-nozes.

— Como vocês puderam perceber. — Começo a falar. — Quando nosso amigo aqui chamou pela segurança, em questão de segundos vocês já estavam aqui, ou seja, vocês estão por toda a parte fazendo a segurança não só da mansão como do próprio Noel. — Os rostos dos quebra-nozes não demonstravam emoção alguma, já o duende transpassava claramente que não estava gostando nada do que estava ouvindo. — O que ajudou a inocentar um garoto e um ser mágico: somente alguém de dentro teria acesso irrestrito à mansão e à fábrica assim como ao próprio Papai Noel.

— Faz sentido, senhor, mas aonde quer chegar? — Pergunta o mesmo quebra-nozes que havia me dado a oportunidade de eu contar minha história.

— Não é óbvio? A pessoa, aliás, o ser responsável pelo sequestro do velho Nicolau está nesta sala.

— Ah! Então foi um de vocês dois? — Pergunta o duende, ironizando a situação.

— Não... Foi você! — Respondo.

— Mentira! Eu sou o duende mais fiel do Noel. Estamos juntos quase a cinco séculos.

— Justamente por isso. Até então todos os investigadores estavam atrás de pistas falsas; pistas que levavam até Rassuvetra, mas ele não teria como ter realizado o sequestro, não com a guarda do quebra-nozes. — Há um silêncio momentâneo. — Mas tenho que admitir que só fui ligar os fatos a você com isto. — Mostro o bilhete que Cláudio havia encontrado na fábrica. — Você foi esperto em trancar as portas das fábricas, mas se esqueceu da portinhola da chaminé.

— Desculpe, mas, mesmo assim ainda não vejo ligação. — Torna a falar o mesmo quebra-nozes.

— Quando batemos a porta pela primeira vez, ele nos disse que estava cansado e que éramos a septuagésima nona dupla de investigadores a bater na porta, mas oficialmente só a InterPol tem jurisdição no Polo Norte, ou seja, éramos na verdade a primeira dupla a bater na porta. — Finalmente os quebra-nozes deixaram seus rostos esboçarem alguma reação: sinalizavam claramente que não só haviam acreditado em mim como estavam extremamente decepcionados com aquele duende.

— Infelizmente terei que fazer isto: “Bréagach”. — Diz o quebra-nozes, ao duende, parecendo que o pobre coitado havia acabado de tomar um forte soco na boa do estômago. — Onde está nosso querido Papai Noel?

De repente o duende começa a se contorcer no chão. Utilizava todas as suas forças para não abrir a boca.

— Ele... Ele... Ele... Está dentro de um compartimento falso, no porão. — Responde o duende, visivelmente irritado.

Rapidamente os quebra-nozes libertam o Noel, que retribui com uma gostosa risada e um forte abraço.

Com tudo resolvido — e o duende Bréagach devidamente castigado — nos sentamos na sala de estar com o bom velinho, que havia pedido para que outros duendes nos servissem chá com biscoito.

— Ho, ho, ho! Vocês não somente salvaram a mim como também os presentes e, claro, o natal. — Diz o Noel, bebericando um pouco de chá.

— Agora só basta que o senhor vá a público acalmar os ânimos e avisar a todos que ano que vem teremos natal. — Responde Cláudio.

— E quem disse que eu me referia ao natal do próximo ano? Por favor, meu relógio. — Uma duendezinha miúda entra na sala com relógio de pulso nas mãos. Papai Noel o pega e, como se fosse arrumar as horas, move os ponteiros no sentido anti-horário. — Agora, rapazes, esta é nossa despedida. Tenham um feliz natal! — E ele aperta o botão do relógio.

Como se eu tivesse entrado em um daqueles brinquedos giratórios, tudo ao meu redor começa a girar. Quando tudo volta ao normal me vejo novamente no escritório, junto ao Cláudio, assistindo ao mesmo filme do início desta história na Sessão da Tarde. O calendário na parede não mentia: havíamos voltado para o dia 23 de dezembro de 2013.

— Mas como? — Indago a Cláudio.

— Eu não sei. — Responde-me ele.

Quando conseguimos colocar nossas cabeças no lugar, notamos uma linda árvore com vários presentes em um canto de nosso escritório. Preso a um dos galhos havia um bilhete:

Meus caros amigos!

Muitíssimo obrigado por terem me salvado. Infelizmente não tivemos a oportunidade de nos despedirmos como deveríamos — o relógio que vocês viram só consegue realizar curtas viagens no tempo.

Contudo, nem tudo está perdido: eu reli a lista de presentes de vocês e espero que gostem do que eu lhes dei.


Do seu novo e eterno amigo.

Papai Noel.


Como uma criança, abro correndo um dos presentes que estavam embaixo da árvore. Da caixa sai uma forte luz branca que ilumina todo o escritório. Quando ela se apaga, aquele velho escritório havia se tornado um dos mais modernos que existiam no país.

Claro, havia mais presentes, mas não é interessante para esta história dizer quais foram eles. Em todo o caso resta dizer que, caso você precise de detetives particulares pode sempre contar com a G&C detetives associados.

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